quarta-feira, 6 de abril de 2011

Amor, da guerra ao jardim

“O amor é um campo de batalhas”, ouvi isto num filme ontem. Acho mesmo que tem alguma verdade nisto. Meu primeiro amor aconteceu quando eu tinha uns 4 anos - estava no jardim da infância. Ainda hoje tenho fotos do garoto. O menino povoava minha mente durante aquelas horinhas no colégio. Criança tem isso de bom, tudo é o momento. Queria estar ao lado dele o tempo todo e ai da menina que ousasse chegar perto da pequena criatura de olhos verdes e cabelos loiros, espetados.

Na festa junina, fui a noivinha e me apresentaram um noivo que não era o meu loirinho, que por sua vez estava no papel do padre. "Padre????!!!" Até hoje lembro o escândalo: “Eu quero me casar com o padreeeeeeeeeeeee...”. Eu era uma criancinha geniosa. Tia Gilza inverteu os papéis e eu me casei com o ex-padre. Ufa! É evidente que aos 4 anos eu não sabia o que era amor. Mas já lutava por ele, nem que fosse aos gritos.

Quando meu segundo amor surgiu, já estava com uns 6 anos; durou até os 9 anos. Marcelo me deu o primeiro selinho embaixo da cama de meus pais. Ainda lembro bem. Era meu namoradinho e todo mundo – nossos pais, inclusive - sabia disso. “Coisa de criança”, diziam. O namorico durou pouco mais de 3 anos e ficou apenas na inocência de alguns selinhos e mãos dadas. E muitas, muitas brincadeiras de rua. Nesse meio tempo, lembro-me de ter procurado Marcelo aos prantos. Minha amiga Patrícia havia me feito uma “revelação” pavorosa. O Natal tinha passado há poucos dias; eu estava feliz da vida por ter ganhado a boneca Tippy. Patrícia me chamou de canto e foi enfática:

- Preciso te contar uma coisa: Papai Noel não existe.
- Como não???? Ele me trouxe a boneca...
- Ele morreu, Lorena. Estava no alto da montanha e uma águia enorme o devorou. Está morto.
- Coitadinho!!!! Marcelooooooooo... Buáaaaaaa.

Esta foi minha primeira grande “perda”. E me fez descobrir que o amor ia além das mãos dadas; que amar era ser companheiro em todas as horas e saber dividir também os momentos ruins.

Aos 10 anos, me apaixonei de verdade. Agora já sabia o que era esse negócio de amor, dentro das minhas possibilidades emocionais. Era o Renato. Loiro e de olhos incrivelmente azuis, meio gordinho e com um sorriso alvo e largo. Ele me fascinava. Mas a gente brigava o tempo todo. E, sei lá porque cargas d’água, a turma da 5ª série nos elegeu líder de sala. Nos beliscávamos, nos xingávamos, mas estávamos sempre juntos. Não namoramos exatamente. Contudo, era a emoção que este amor platônico me despertava que me ajudou desviar a atenção de momentos difíceis que vivia em casa, com a doença de minha mãe. Depois do Renato tive vários outros amores platônicos, muito mais até do que namorados de fato.

Descobri, então, que amar dói muito. Mas que lutar por um amor, dói muito mais. Descobri que o amor é mesmo um campo de batalhas. E que isto pode ser bom, sim. Descobri que o amor é uma junção de valores que nos faz encontrar a nossa própria essência através do outro. Descobri também que uma guerra pode ser vencida quando se dá uma pausa para descansar.

Lembro-me que quando era criança tinha muita joaninha no jardim lá de casa. Daquelas vermelhas com bolinhas pretas. Eu amava joaninhas e vivia tentando pegá-las. Dificilmente conseguia. Até que, um dia, adormeci na minha cadeirinha de praia, num cantinho do jardim. Quando acordei, havia duas joaninhas, bem tranqüilas, pousadas em meu braço. Eu dei pulos de alegria.

Muitas vezes, o amor é mais ou menos assim. Quando a gente acha que já fez tudo para conquistá-lo, decide entregar as armas e desistir da guerra, ele vem pra gente bem sorrateiro. Porém, o fim de uma guerra pode significar apenas isso. Ou seja, uma derrota para um dos lados. A gente sai dela meio ralado, machucado, mas isso é parte do processo.

Acho que vou entregar minhas armas e bater em retirada... Não ouço mais o rufar frenético dos tambores que me ensurdeciam numa batalha solitária e platônica. Lembrando Mia Couto, “porque o tempo em que vivo morre de ser ontem, e é urgente inventar outra maneira de navegar, outro rumo, outro pulsar para dar esperança aos portos”.
(Originalmente postado em Talentos)

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